Psiquiatra
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pesquisa Carl Gustav Jung em 1900
Nascimento 26 de julho de 1875
Kesswil, Suíça
Morte 6 de junho de 1961
Küsnacht, Suíça
Escola/tradição Psicanálise,
Idéias notáveis, Inconsciente coletivo.
Influências Sigmund Freud
Carl Gustav Jung (Kesswil, 26 de julho de 1875 - Küsnacht, 6 de junho de 1961)
foi um psiquiatra suíço e fundador da psicologia analítica,
também conhecida como psicologia junguiana
Juventude
Os assuntos com que Jung ocupou-se surgiram em parte do fundo pessoal que é vividamente descrito em sua autobiografia, "Memórias, Sonhos, Reflexões" (1961). Ao longo de sua vida Jung experimentou sonhos periódicos e visões com notáveis características mitológicas e religiosas, os quais despertaram o interesse por mitos, sonhos e a psicologia da religião. Ao lado destas experiências, certos fenômenos parapsicológicos emergiam, sempre para lhe redobrar o espanto e o questionamento.
Por muitos anos Jung sentiu possuir duas personalidades separadas: um ego público, exterior, que era envolvido com o mundo familiar, e um eu interno, secreto, que tinha uma proximidade especial para com Deus. Ele reconhecia ter herdado isso de sua mãe, que tinha a notável capacidade de "ver homens e coisas tais como são". A interação entre esses egos foi o tema central da sua vida pessoal e contribuiu mais tarde para a sua ênfase no esforço do indivíduo para integração e inteireza.
O pai, um reverendo, já deixou-lhe como herança uma fé cega que se mantinha a muito custo com o sacrifício da compreensão. A tarefa do filho seria responder a ele com uma fé renovada, baseada justamente no conhecimento tão rejeitado. Além disso, Jung viria a usar as escrituras como referência para a experiência interior de Deus, não como dogmas estáticos à espera de devoção muda, castradores do desenvolvimento pessoal. Ele lamentava que à religião faltasse o empirismo, que alimentaria a sede da personalidade:
n.º 1, e que às ciências naturais, que também tanto o fascinavam devido ao envolvimento com a realidade concreta, faltasse o significado, que saciaria a personalidade
n.º 2. Os dois aspectos, religião e ciência, não se tocavam, daí sua constante insatisfação, devido ao desencontro das duas instâncias interiores. E foi dessa tentativa de saciar tanto um aspecto quanto ao outro, de fazer justiça ao ser como um todo, que decidiu formar-se em psiquiatria: "Lá estava o campo comum da experiência dos dados biológicos e dados espirituais, que até então eu buscara inutilmente. Tratava-se, enfim, do lugar em que o encontro da natureza e do espírito se torna realidade".
Ao longo da sua juventude interessou-se por filosofia e por literatura, especialmente pelas obras de Pitágoras, Empédocles, Heráclito, Platão, Kant e Goethe. Uma das suas maiores revelações seria a obra de Schopenhauer. Jung concordava com o irracionalismo que este autor concedia à natureza humana, embora discordasse das soluções por ele apresentadas.
Primeiros estudos
Jung em 1909.
Já estudante de medicina, decide dedicar-se à, então obscura,
especialidade de psiquiatria, após a leitura ocasional
de um livro do psiquiatra Krafft-Ebing.
Em 1900, Jung tornou-se interno na Clínica Psiquiátrica Burgholzli,
em Zurique, então dirigida pelo psiquiatra Eugen Bleuler,
famoso pela sua concepção de esquizofrenia.
Seguindo o seu treino prático na clínica,
ele conduziu estudos com a associação de palavras.
Já nessa época Jung propunha
uma atitude humanista frente aos pacientes.
O médico deveria "propor perguntas que digam respeito ao homem
em sua totalidade e não limitar-se apenas aos sintomas".
Desde cedo ele já adiantava a idéia do que hoje está ganhando força
em todos os campos com o nome de "Holismo",
o ponto de vista do homem integral.
A seus olhos "diante do paciente só existe a compreensão individual".
Por isso evitava generalizar um método, uma panacéia
para um determinado tipo de anomalia psíquica.
Cada encontro é único e, sendo assim,
não pode incorrer em qualquer tipo de padronização.
Encontro com Sigmund Freud
Em 1902 deslocou-se a Paris onde estudou com Pierre Janet,
regressando no ano seguinte ao hospital de Burgholzli
onde assumiu um cargo de chefia e onde,
em 1904, montou um laboratório experimental
em que implementou o seu célebre teste
de associação de palavras para o diagnóstico psiquiátrico.
Neste interim, Jung entra em contato com as obras de Sigmund Freud (1856-1939).
Jung viu em Freud um companheiro para desbravar os caminhos da mente.
Enviou-lhe copias de seus trabalhos sobre a existência do inconsciente,
confirmando concepções freudianas de recalque e repressão.
Ambos encantaram-se um com o outro,
principalmente porque os dois
desenvolviam trabalhos inéditos em medicina e psiquiatria.
Primeira fileira:Sigmund Freud, Stanley Hall, Carl Gustav Jung; segunda fileira: Abraham Brill, Ernest Jones, Sandor Ferenczi. Universidade de Clark, Massachusetts, Estados Unidos da América, Setembro de 1909
Carta de Freud a Jung (de 1913).
A partir de então Freud e Jung passaram a se corresponder
(359 cartas que posteriormente foram publicadas entre 1906 a 1913).
O primeiro encontro entre eles, em 27 de fevereiro de 1907,
transformou-se numa conversa que durou treze horas ininterruptas.
Depois deste encontro estabeleceram uma amizade
de aproximadamente sete anos, durante a qual trocavam informações
sobre seus sonhos, análises, trocavam confidências, discutiam casos clínicos.
Porém, tamanha identidade de pensamentos e amizade
não conseguia esconder algumas diferenças fundamentais.
Jung jamais conseguiu aceitar a insistência de Freud
de que as causas dos conflitos psíquicos
sempre envolveriam algum trauma de natureza sexual,
e Freud não admitia o interesse de Jung pelos fenômenos espirituais
como fontes válidas de estudo em si.
O rompimento entre eles foi inevitável.
Seria nos anos 30 do século XX
que esta divergência atingiria o auge.
Se por um lado os livros de Freud eram proibidos e queimados publicamente
pelos Nazistas, sendo Freud obrigado a deixar Viena pouco depois da anexação da Áustria,
doente, nos seus 80 anos, para se dirigir ao exílio em Londres
enquanto que quatro irmãs suas não foram autorizadas a deixar a Áustria,
tendo perecido no Holocausto nos campos de concentração de Auschwitz
e de Thereseinstadt, por seu lado Carl Jung tornar-se-ia neste mesmo período
uma das faces mais visíveis da psiquiatria "alemã" da época.
Confronto com o inconsciente
Após a separação de Freud, Jung sentiu o chão desmoronar-se sob os pés.
O sentido da sua vida ficou em primeiro plano.
Seguiu-se uma série de sonhos e visões
que forneceram material para o trabalho de toda uma vida.
Dir-se-ia que se ele não houvesse se empenhado
na integração de todo aquele material que jorrou
qual lava derretida, teria fatalmente sucumbido a uma psicose.
Mas algo nele o impelia a ir adiante na compreensão
de tudo o que se originava naturalmente de seu inconsciente.
Em suas palavras, "Os anos durante os quais me detive
nessas imagens interiores constituíram
a época mais importante da minha vida e
neles todas as coisas essenciais se decidiram.
Toda a minha atividade ulterior consistiu
em elaborar o que jorrava do inconsciente naqueles anos .
Foi durante essa fase de confronto com o inconsciente que
ele desenvolveu o que chamou de "imaginação ativa",
um método de interação com o inconsciente
onde este se investe espontaneamente de várias personificações
(pessoas conhecidas e desconhecidas, animais, plantas, lugares, acontecimentos, etc.).
Na imaginação ativa interagimos ativamente com elas,
isto é, discordando, quando for o caso,
opinando, questionando e até tomando providências
com relação ao que é tratado, isso tudo pela imaginação.
Ela difere da fantasia passiva porque nesta não atuamos
no quadro mental, de forma a participarmos do drama
vivenciado, mas apenas nos contentamos em assistir
o desenrolar do roteiro desconhecido.
Pela imaginação ativa existe não só a possibilidade
de compreensão do inconsciente,
mas também de interação com este, de forma que o transformamos
e somos transformados no processo.
Um personagem pode nos fazer entender falando explicitamente
do motivo de, por exemplo, estarmos com insônia.
Esse enfoque trata a psique como uma realidade em si,
de forma tão literal interiormente,
quanto uma maçã nos é real exteriormente,
ao contrário de Freud que insistia em substituir
uma determinada imagem por outra de cunho sexual.
Polêmicas sobre nazismo
Carl Jung, que alguns acham ter sido um simpatizante do nazismo,
assumiu em 1933, ano da chegada ao poder de Adolf Hitler,
a presidência da "Sociedade Médica Internacional Geral para a Psicoterapia",
que contou como administrador, entre outros, um sobrinho de Hermann Göring.
No início de 1934, num artigo "Sobre a situação actual da psicoterapia",
Jung afirma que o Judeu, como nómade,
não pode jamais criar a sua cultura própria;
para desenvolver os seus instintos e talentos
tem de apoiar-se em um "povo anfitrião mais ou menos civilizado".
Carl Jung viria mais tarde a deixar aquela organização.
Sejam examinados os fatos. O presidente da Sociedade era Ernst Kretschmer.
Quando Hitler tomou o poder, Kretschmer deixou a presidência
e os membros da Sociedade, compreensivelmente alarmados,
dada a situação da Alemanha, pediram insistentemente a Jung
que aceitasse a presidência.
Sua autoridade cientifica e sua condição de suíço
representavam verdadeira tábua de salvação.
"Deveria eu, perguntou Jung a seus acusadores,
na atitude de neutro prudente retirar-me para a segurança do lado
de cá da fronteira e lavar as mãos em inocência,
ou deveria segundo estava bem consciente arriscar minha pele
e expor-me a inevitáveis malentendidos,
aos quais não poderia escapar todo aquele que,
por força de premente necessidade,
tivesse de entrar em contato com
os poderes políticos existentes na Alemanha"?
Jung decidiu correr os riscos que previra.
Sob a presidência de Jung,
a Sociedade Médica Internacional de Psicoterapia
conseguiu realizar dois congressos fora da Alemanha:
um, em Copenhague (1937) e outro em Oxford (1938).
Decerto esses encontros, noutros países,
representaram verdadeiros respiradouros
para muitos cientistas alemães (Silveira, 1981).
Jung interpretou o nacional socialismo como fenômeno patológico.
Uma irrupção do inconsciente coletivo.
"Wotan” havia tomado posse da alma do povo alemão.
E quem é Wotan? O deus pagão dos germânicos,
"um deus das tempestades e da efervescência,
desencadeia paixões e apetites combativos".
Num ensaio publicado em 1936,
Jung traça o paralelo entre Wotan redivivo e o fenômeno nazista.
Wotan é uma personificação de forças psíquicas
corresponde a uma qualidade, um caráter fundamental da alma alemã,
um "fator" psíquico de natureza irracional,
um ciclone que anula e varre para longe a zona calma
onde reina a cultura.
Os fatores econômicos e políticos
pareceram a Jung insuficientes para explicar
todos os espantosos fenômenos que estavam
ocorrendo na Alemanha.
Wotan reativado no fundo do inconsciente,
Wotan invasor, seria explicação mais pertinente.
E estávamos apenas em 1936!
O argumento decisivo é, porém, a atitude dos nazistas em relação a Jung.
Com o aparecimento do livro PSICOLOGIA e RELIGIÃO, 1940,
as autoridades decidiram que toda a sua obra
fosse interditada e queimada na Alemanha,
bem como nos países ocupados por Hitler.
Outra acusação correlata com a de simpatizante do nazismo,
foi a de anti-semita. Seria desde logo estranho admitir que um psicólogo,
toda sua vida em busca do fundo psíquico comum
a todos os homens (inconsciente coletivo),
eternamente existente sob as diferentes peculiaridades individuais,
locais, nacionais, raciais, históricas,
fosse partidário de discriminações entre esses mesmos homens
cuja alma tinha para ele igual estrutura básica.
Seria também extravagante que um anti-semita
contasse entre seus discípulos mais próximos
precisamente homens de origem semita.
Basta lembrar alguns nomes. Erich Neumann, judeu alemão.
Chefiava o grupo jungueano em Tel Aviv, Israel, onde morreu em 1960,
Seus livros são originais aplicações da psicologia jungueana.
AS ORIGENS E A HISTÓRIA DA CONSCIÊNCIA,
sua obra principal, é prefaciada por Jung. Gerhard Adler,
judeu alemão, refugiado do nazismo, um dos mais destacados
elementos do grupo jungueano na Inglaterra,
co-editor das obras completas de Jung.
Adler define esses ataques a Jung como devidos a
"completa ignorância ou, pior, a maldade intencional".
Roland Cahen, francês de origem semita,
é quem chefia a escola jungueana na França e
dirige a publicação das obras de Jung em língua francesa. (cf: Silveira, 1981)
Em alguns documentos, afirmou num comentário de época
sobre a cultura judaica que judeus em geral são mais conscientes
e diferenciados, enquanto os 'arianos' comuns
permaneceram próximos à barbárie (apud Lomeli, 1999).
A polêmica teórica mantida por Jung com Freud
não chegou ao ponto de Jung fazer referências
à origem religiosa ou racial de Freud,
com vistas a conquistar a simpatia nazista.
Nem no artigo de 1929, em que comparava
as duas teorias (Gallard, 1994 apud Medweth, 1996),
nem no discurso de Jung sobre Freud
após a morte deste eminente pensador, em 1939,
num momento que poderia ser propício
a angariar aquele beneplácito (Medweth, 1996).
Sabe-se também que o obscurantismo atingiu obras de Jung
que não interessavam ao regime nazista,
tendo sido suprimidas em 1940
várias edições publicadas na Alemanha,
e quando da invasão da França a Gestapo
destruiu as traduções francesas da obra de Jung. (Medweth, 1996).
As primeiras providências de Jung
quando assumiu a Überstaatliche Ärztliche Gesellschaft für Psychotherapie
(Sociedade Médica Internacional para Psicoterapia),
acumulando com a entidade suíça, em 1933, foram:
♥ A reformulação dos estatutos, para evitar
o controle hegemônico por alguma das sociedades nacionais;
como a Sociedade Internacional congregava
as Sociedades Nacionais da Alemanha,
Dinamarca, Grã-Bretanha, Países Baixos,
Suécia e Suíça, era importante
evitar o domínio isolado de uma delas
(apud Lomeli, 1999; McGuire e Hull, 1982),
de modo que as demais
tivessem participação adequada
e dividissem as responsabilidades;
♥ A aceitação na Sociedade Internacional dos membros judeus
e antinazistas expulsos da Sociedade da Alemanha
(apud Lomeli, 1999; McGuire e Hull, 1982),
de modo que eles podiam exercer o seu ofício
em outros países e garantir a sua subsistência
como profissionais qualificados.
Sobre o editorial nazista publicado na revista
editada pela Sociedade Médica Nacional da Alemanha
para Psicoterapia, Jung declarou várias vezes
que ele não teve ingerência no episódio.
Pelas amizades que tinha com muitos representantes
das vítimas do preconceito nazista,
e pelo conteúdo de sua obra,
é extremamente improvável que ele concordasse
intelectualmente com o seu conteúdo,
sob pena de perder esses relacionamentos.
As acusações sobre Jung, como resultantes de um mal-entendido,
teriam sido logo liquidadas de modo definitivo,
face a tantas documentações e testemunhos logicamente irrefutáveis.
Entretanto, a persistência desses rumores bem indica que por trás
deles podem fermentar ainda as divergências
entre Jung e o grande judeu Freud,
nunca perdoadas pelos discípulos do mestre ortodoxo.
(Silveira, 1981)
Jung em 1910.
Congreso Psicoanalítico Internacional de 1911,
presidido por Jung (no centro, à direita de Freud).
Reconhecimento internacional
Em 1938, quando Freud saiu de Viena para Londres,
a Dra. Iolande Iacobi também emigrou para Zurique,
continuou seus estudos com Jung e posteriormente
foi uma das fundadoras do Instituto C.G.Jung,
tendo escrito a introdução às obras completas de Jung.
(McGuire e Hull, 1982, p. 52).
Ainda nesse ano, a Universidade de Oxford, na Inglaterra,
concedeu-lhe o título de Doutor Honoris Causa.
Em 1939 Jung renunciou à presidência da
Sociedade Médica Internacional para Psicoterapia.
Alegou que já tentara por duas vezes anteriores
a renúncia, tendo permanecido apenas
devido a pedidos dos representantes britânico e
neerlandês, somente se retirando
quando foram interrompidas
as comunicações internacionais
e a sua permanência não era mais necessária
(apud Loneli).
Em 1946, em cerimônia realizada em Zurique,
Winston Churchill pediu que o Dr, Jung
compusesse a mesa e se sentasse a seu lado (Lomeli, 1999).
Em abril desse ano Ernest Harms publicou um artigo
cujo título é “Carl Gustav Jung – Defender of Freud and the Jews”
na Psychiatric Quarterly (McGuire e Hull, 1982, p. 70).
Alguns dos seus mais devotados pupilos – Erich Neumann,
Gerhard Adler, James Kirsch e Aniela Jaffe
– eram Judeus (Medweth, 1996).
- Citações: Lomeli, 1999; Medweth, 1996;
McGuire, William e Hull, R.F.C. (1982).
C.C.Jung: entrevistas e encontros. São Paulo: Cultrix.
Últimos dias
Carl Gustav Jung morreu a 6 de junho de 1961,
aos 86 anos, em sua casa, nas margens do lago de Zurique,
em Küsnacht após uma longa vida produtiva,
que marcou - e tudo leva a crer que ainda marcará mais -
a Antropologia, a Sociologia e a Psicologia,
e também, em outros campos como:
a Arte, a Literatura e a Mitologia.
A psicologia analítica
Anterior mesmo ao período em que estavam juntos,
Jung começou a desenvolver uma sistema teórico
que chamou, originalmente, de "Psicologia dos Complexos",
mais tarde chamando-a de "Psicologia Analítica",
como resultado direto de seu contato prático com seus pacientes.
O conceito de inconsciente já está bem sedimentado
na sólida base psiquiátrica de Jung
antes de seu contato pessoal com Freud,
mas foi com Freud, real formulador do conceito
em termos clínicos, que Jung pôde se basear
para aprofundar seus próprios estudos.
O contato entre os dois homens foi extremamente rico para ambos,
durante o período de parceria entre eles.
Aliás, foi Jung quem cunhou o termo
e a noção básica de "complexo", que foi adotado por Freud.
Utilizando-se do conceito de "complexos" e
do estudo dos sonhos e de desenhos,
Jung passou a se dedicar profundamente aos meios pelos quais se expressa o inconsciente. Em sua teoria, enquanto o inconsciente pessoal consiste fundamentalmente de material reprimido e de complexos, o inconsciente coletivo é composto fundamentalmente de uma tendência para sensibilizar-se com certas imagens, ou melhor, símbolos que constelam sentimentos profundos de apelo universal, os arquétipos: da mesma forma que animais e homens parecem possuir atitudes inatas, chamadas de instintos ("fato" este negado por correntes de ciências humanas, como por exemplo em antropologia o culturalismo de Franz Boas ), também é provável que em nosso psiquismo exista um material psíquico com alguma analogia com os instintos.
Os tipos psicológicos
Jung sentia que a ênfase da psicanálise
nos fatores eróticos era um ponto de vista unilateral,
uma visão reducionista da motivação humana e
do seu comportamento.
Ele propôs que a motivação do homem fosse
entendida em termos de uma energia de vida criativa geral
- a libido - capaz de ser investida em direções diferentes,
assumindo grande variedade de formas.
A libido corresponderia ao conceito de energia adotado na Física,
a qual pode ser interpretada em termos de calor, eletricidade, motricidade, etc.
As duas direções principais da libido
são conhecidas como
extroversão (projetada no mundo exterior, nas outras pessoas e objetos) e
introversão (dirigida para dentro do reino das imagens, das idéias, e do inconsciente).
As pessoas em quem a primeira tendência direcional predomina
são chamadas extrovertidas,
e introvertidas aquelas em quem a segunda direção é mais forte.
A sua necessidade em criar uma tipologia psíquica
decorreu da questão que nasceu em seu interior
acerca de sua divergência com Freud e até com outros profissionais.
Ele poderia, assim, ter perguntado: "Por que divirjo de Freud?".
A resposta tomou forma na análise que fez
das teorias psicológicas de seu mestre e de Adler,
também um ex-discípulo de Freud.
Para este as neuroses derivavam de problemas com os instintos,
para o outro do próprio ego,
no seu sentimento de superioridade ou inferioridade.
Um, portanto, extrovertido, e o outro introvertido.
Jung também propôs que se poderia agrupar as pessoas
de acordo com o seu maior desenvolvimento
em uma das quatro funções psicológicas:
pensamento, sentimento, sensação, ou intuição.
Transformações de libido de uma esfera de expressão para outra
- por exemplo, de sexualidade para religião -
são realizadas por símbolos que são gerados durante a mudança de personalidade.
A psicologia junguiana também merece outro destaque:
o processo de individuação.
Conforme Nise da Silveira (2006) todo ser tende
a realizar o que existe nele, em germe,
a crescer, a completar-se.
Assim é para a semente do vegetal e para o embrião do animal.
Assim é para o homem, embora o desenvolvimento
de suas potencialidades seja impulsinado
por forças instintivas inconscientes,
isso adquire um caráter peculiar:
o homem é capaz de tomar consciência
desse desenvolvimento e de influenciá-lo.
Precisamente no confronto do inconsciente com o consciente,
no conflito como na colaboração entre ambos é que
os diversos componentes da personalidade amadurecem e
unem-se numa síntese, na realização
de um indivíduo específico e inteiro.
Essa confrontação "é o velho jogo do martelo e da bigorna:
entre os dois, o homem, como o ferro, é forjado num todo indestrutível,
num indivíduo. Isso, em termos toscos,
é o que eu entendo por processo de individuação" (Jung).
O processo de individuação não consiste num desenvolvimento linear.
É um movimento de circunvolução que conduz a um novo centro psíquico.
Jung denominou esse centro de Self (si mesmo).
Quando consciente e inconsciente vêm ordenar-se em torno do Self,
a personalidade completa-se.
O Self será o centro da personalidade total,
como o ego é o centro do campo do consciente.
O conceito junguiano de individuação tem sido muitas vezes deturpado.
Entretanto é claro e simples na sua essência:
tendência instintiva a realizar plenamente potencialidades inatas.
Mas, de fato, a psique humana é tão complexa,
são de tal modo intricados os componentes em jogo,
tão variáveis as intervenções do ego consciente,
tantas as vicissitudes que podem ocorrer,
que o processo de totalização da personalidade
não poderia jamais ser um caminho reto e curto de chão bem batido.
Ao contrário, será um percurso longo e difícil.
A psique objetiva
Jung percebeu que a compreensão da criação de símbolos
era crucial para o entendimento da natureza humana.
Ele então explorou as correspondências entre
os símbolos que surgem nas lutas da vida dos indivíduos
e as imagens simbólicas religiosas subjacentes,
sistemas mitológicos, e mágicos de muitas culturas e eras.
Graças à forte impressão que lhe causou as muitas
notáveis semelhanças dos símbolos,
apesar de sua origem independente nas pessoas
e nas culturas (muitos sonhos e desenhos de seus pacientes de
variadas nacionalidades exprimiam temas mitológicos longínquos),
foi que ele sugeriu a existência de duas camadas
da psique inconsciente: a pessoal e a coletiva.
O inconsciente pessoal inclui conteúdos mentais
adquiridos durante a vida do indivíduo que foram esquecidos
ou reprimidos, enquanto que o inconsciente coletivo
é uma estrutura herdada comum a toda a humanidade
composta dos arquétipos
- predisposições inatas para experimentar e simbolizar
situações humanas universais de diferentes maneiras.
Há arquétipos que correspondem a várias situações,
tais como as relações com os pais, o casamento,
o nascimento dos filhos, o confronto com a morte.
Uma elaboração altamente derivada destes arquétipos
povoa todos os grandes sistemas mitológicos e religiosos do mundo.
Na qualidade de cientista altamente desapegado
e desconfiado do favorecimento que se dá a certas verdades,
para ele materialismo e ciência não eram sinônimos.
O materialismo não passa o culto a um deus
exteriormente concreto por meio da razão,
um tipo de fé nos princípios limitadores das leis físicas.
"A razão nos impõe limites muito estreitos e
apenas nos convida a viver o conhecido".
Para sermos realmente justos, convém recebermos igualmente
os aspectos racionais e irracionais da vida.
Perto do fim da vida Jung também sugeriu que as camadas mais
profundas do inconsciente independem das leis de espaço, tempo e causalidade, dando lugar aos fenômenos paranormais como a clarividência e a precognição.
A estas correspondências entre acontecimentos interiores e exteriores, por meio de um significado comum, ele deu o nome de sincronicidade.
Muitos fatos ocorridos enquanto tratava seus clientes
o fizeram crer que os acontecimentos se dispunham
"de tal modo, como se fossem o sonho de uma 'consciência maior
e mais abrangente, por nós desconhecida'" (Obras Completas Vol. VIII, p. 450).
Sincronicidade
O termo sincronicidade é uma tentativa de encontrar formas de explicação racional
para fenômenos que a ciência de então não alcançava,
tais como os referidos acima, fenômenos não causais que não podem ser explicados pela razão, porém são significativos para o indivíduo que os experimenta.
Para uma abordagem sobre a construção do conceito veja-se Capriotti,
Letícia. Jung e sincronicidade: a construção do conceito).
Para uma explanação sintética e didática de sincronicidade,
veja-se Capriotti, Letícia. Jung e sincronicidade: o conceito e suas armadilhas.)
A construção do conceito de sincronicidade
surgiu da leitura que Jung fez de um grande número de obras sobre alquimia
e o pensamento renascentista.
Jung chegou a possuir grande quantidade de textos alquímicos originais,
que o levaram também a usar a expressão Unus Mundus
em sua autobiografia, e a idéia de Anima Mundi.
Uma interessante análise da contribuição da psicologia profunda de Freud
– Jung para a formação do pensamento ocidental,
mostrando como Jung tinha preocupações epistemológicas
rigorosas pode ser vista em Tarnas.
Em função disso, tais fenômenos puderam ser examinados,
mas apenas como algo psicológico,
e não propriamente da natureza,
resultando em algumas distorções interpretativas, em inúmeros sentidos.
A partir da contribuição de Jung,
vários desenvolvimentos em diferentes áreas do conhecimento
têm ampliado a compreensão da relação
entre os processo psíquicos e o mundo exterior.
O conceito de inconsciente coletivo encontra ecos
na nova física de Bohm e Capra,
nos campos morfogenéticos de Sheldrake,
nas psicologia profunda e na ecopsicologia norte-americanas.
Imagens do inconsciente
No Brasil, Jung teve uma conhecida aluna, a Dra. Nise da Silveira,
fundadora do Museu de Imagens do Inconsciente.
Ela escreveu, dentre outros, o livro “Jung: vida e obra”,
publicado em primeira edição em 1968.
Jung - Uma resposta ao nosso tempo
Na terapia junguiana, que explora extensivamente os sonhos e fantasias,
um diálogo é estabelecido entre a mente consciente e os conteúdos do inconsciente.
A doença psíquica é tida como uma conseqüência
da separação rígida entre elas.
Os pacientes são orientados a ficarem atentos aos significados
pessoal e coletivo (arquétipo) inerente aos seus sintomas e dificuldades.
Sob condições favoráveis eles poderão ingressar
no processo de individuação:
uma longa série de transformações psicológicas
que culminam na integração de tendências e funções opostas,
e na realização da totalidade.
Jung trilhou a individuação,
pois havia a necessidade imperiosa nele de ir ao inferno e voltar
para poder mostrar o caminho da volta
àqueles que ficaram perdidos pelo caminho da vida.
Tornou-se ele uma resposta sincera e corajosa ao nosso tempo.
"Sou eu próprio uma questão colocada ao mundo
e devo fornecer minha resposta; caso contrário,
estarei reduzido à resposta que o mundo me der".
Breve biografia em tópicos
*1875: Nasce na Suíça, a 26 de julho, Carl Gustav Jung, filho de um pastor;
*1895 - 1900: Estuda medicina na Universidade da Basiléia;
*1900: É assistente de Eugen Bleuler, médico-chefe do Burghölzli (hospital psiquiátrico) em Zurique;
*1902: Tese de doutoramento: "Sobre a psicologia e a patologia dos fenômenos ditos ocultos";
Emma Jung
(1882-1955)
Escritora e psicanalista.
Esposa de Carl Jung
(de 14 de Fevereiro de 1903 até a data de seu falecimento).
*1903: Casa-se com Emma. Desta união nascem cinco filhos.
*1905 - 1909: Chefe de clínica no Burghölzli;
*1905 - 1913: Professor na Faculdade de Medicina de Zurique;
aulas de psicologia e psiconeuroses;
*1907: "Psicologia da Demência Precoce"; encontro com Freud;
*1908: I Congresso Internacional de Psicanálise;
*1909: Abertura de clínica particular;
*1910 - 1914: Primeiro presidente da
*Associação Psicanalítica Internacional;
*1913: Jung dá o nome à sua psicologia de "Psicologia Analítica";
*demissão de seu posto de ensino na Universidade de Zurique;
*1914: Conferências em Londres e Aberdeen;
é mobilizado para o serviço de saúde;
*1916: "Sete Sermões aos Mortos" e
"A Função Transcendente"; estudo sobre os gnósticos;
1918 - 1919: Comandante do campo de internação de Soldados ingleses;
pintura de mandalas;
*1921: "Tipos Psicológicos";
*1923: Construção da torre perto do lago de Zurique;
Jung trava amizade com Richard Wilhelm
(tradutor do "I Ching - O Livro das Mutações");
1924 - 1925: Visita aos índios Pueblo do Novo México (EUA);
1925 - 1926: Expedição a Uganda, ao Quênia, às margens do Nilo;
visita aos Elgonys no Monte Elgon;
*1928: "O Eu e o Inconsciente";
*1929: Comentário de "O Segredo da Flor de Ouro";
*1932: Prêmio de literatura em Zurique;
*1933: Viagem ao Egito e Palestina;
*1934: Presidente da Sociedade Médica Geral para Psicoterapia;
*1936: Doutor "honoris causa" em Harvard (Massachussets);
*1938: Viagem à Índia, a convite do governo britânico;
presidente do Congresso Internacional de Psicoterapia,
em Oxford; membro da Real Sociedade de Medicina;
*1940: "Psicologia e Religião";
*1944: Nomeação para a cátedra de
Psicologia da Faculdade de Medicina de Basiléia;
*"Psicologia e Alquimia";
*1945: Doutor "honoris causa" da Universidade de Genebra;
*1948: Inauguração do Instituto C. G. Jung em Zurique;
951: "Aion";
*1952: "Sincronicidade" e "Resposta a Jó";
*1955: Morte de sua mulher a 27 de novembro;
*1955 - 1956: "Mysterium Conjunctionis";
*1957: Começo da redação de "Memórias,
Sonhos e Reflexões", com Aniela Jaffé; entrevista na TV para a BBC;
*1961: Termina, dez dias antes de morrer, um ensaio para
"O Homem e Seus Símbolos"; morre a 6 de junho.
Obras
Devido à metodologia usada por Jung,
seus escritos costumam ser de leitura difícil e penosa.
É recomendável iniciar por algum de seus comentadores,
como Nise da Silveira (Jung: vida e obra) e
Aniela Jaffe (Memórias, sonhos e reflexões de C. C. Jung).
Obras de Jung, publicadas em português no Brasil:
• A Energia Psíquica.
• A Prática da Psicoterapia.
• A Vida Simbólica: Escritos Diversos.
• Ab-reação, análise dos sonhos, transferência.
• Aion: Estudos sobre o Simbolismo do Si-mesmo.
• Cartas de Carl Gustav Jung.
• Consideraciones Sobre la Historia Actual (ainda não traduzido para língua portuguesa).
• Escritos Diversos.
• Estudos Alquímicos.
• Estudos Experimentais Vol. II.
• Estudos Experimentais.
• Estudos Psiquiátricos.
• Eu e o Inconsciente.
• Freud e a Psicanálise.
• Interpretação Psicológica do Dogma da Trindade.
• Memórias, Sonhos e Reflexões.
( Autobiografia escrita em conjunto com Aniela Jaffé).
• Misterium Coniunctionis 1.
• Misterium Coniunctionis 2.
• Misterium Coniunctionis 3.
• O Desenvolvimento da Personalidade.
• O Homem e seus Símbolos.
( Obra para leigos, organizada por Jung
e escrita por ele e seus colaboradores,
com artigos de Aniella Jaffé,
Marie-Louise fon Franz e outros.)
• O Segredo da Flor de Ouro: Um Livro de Vida Chinesa.
• Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo.
• Presente e Futuro.
• Psicologia da Religião Ocidental e Oriental.
• Psicologia do Inconsciente.
• Psicologia e Alquimia.
• Psicologia e Religião Oriental.
• Psicologia e Religião.
• Símbolo da Transformação na Missa.
• Símbolos da Transformação:
Análise dos Prelúdios de uma Esquizofrenia.
• Sincronicidade.
• Tipos Psicológicos.
• A natureza da psique.
Algumas Frases de Jung
"Nenhum homem é uma ilha, fechada sobre si;
todos são parte de um continente, uma parcela de terra principal"
"Podemos pensar durante toda a vida que seguimos nossas próprias idéias,
sem descobrir que fomos os comparsas essenciais no palco do teatro universal"
"Ser normal é a meta dos fracassados"
"Quem olha para fora, sonha. Quem olha para dentro, acorda"
"Do mesmo modo que aquele que fere ao outro fere a si próprio,
aquele que cura cura-se a si mesmo"
"A reunião de duas personalidades é como o contato de duas substâncias químicas:
se houver alguma reação, ambos estão transformados"
Carl Gustav Jung com seis aninhos:
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